terça-feira, 30 de dezembro de 2008

A uma amiga

Boa amiga Clarisse, finalmente,
Lhe venho dar notícias e dizer
Que, ler os seus escritos é um prazer.
Estranha o meu silêncio, certamente...

Não leve a mal, se tardo em responder:
Eu, só uso a internet, raramente.
É estranho, mas sou mesmo renitente
Em fazer um esforço... a aprender...

Já passou o Natal. E, só agora,.
Lhe manifesto os votos (e são tantos!...)
Para Deus a alegrar em cada hora,

E tenha um Novo Ano só de encantos.
Porque o dois mil e nove não demora,
Que transborde em virtudes só de santos

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Natal

Tem mistério, tem magia
Esta palavra Natal:
Poder espiritual
Do Amor e da Alegria.

Os sentimentos reais
Que esta palavra condensa,
Alivia indiferença
Entre os indignos mortais...

Sentem se então irmanados
E de corações unidos;
Quando, dos ódios despidos,
São por Deus abençoados.

O Natal do Deus Menino
Já se deu há dois mil anos!
Resiste sempre aos profanos
O sentimento Divino.

Somente um Deus Redentor,
Vindo à Terra, humanado,
Podia ter transformado
Paixões e ódio em Amor.

2001

Jesus

Vem, Jesus, vem comigo,
Que peregrino na Terra
Sem encontrar um amigo
Onde existem ódio e guerra.
Sendo o homem traiçoeiro,
Dele só nos vem a dor.
Sede Vós meu companheiro
Neste deserto de Amor...

Eu e a internet

I

Quem me fala, calado e escondido,
Dentro da Internet duvidosa?...
É alguém que me deixa receosa:
Não tem voz, nem há rosto definido…

Pode ser amizade preciosa,
A tornar este jogo divertido;
Mas pode ser, também, um foragido,
Buscando alguma cúmplice, engenhosa,

Que através da Internet lhe dê fuga…
Com anonimato é que eu desatino:
A minha mente hesita e se enruga,

Por não poder saber qual o destino
De pensamentos, que um ecrã me suga:
Se os dá a amigos meus, ou a cretino…

Um ninho de andorinha

Certo dia uma andorinha,
Constrói a sua cazinha,
Num lugar a seu contento:
É num moinho de vento,
Parado à noite e de dia,
Porque há muito não moía.
Não foi dentro do moinho
Que fizera o seu ninho.
Fê-lo, de certa maneira,
Numa das pás de madeira
Que formam a ventoinha.
Já rachada, já velhinha,
Apodrecendo, travada,
Porque já não era usada.
Ela fez os seus projectos,
Fez cálculos muito certos.
Juntou os materiais:
Muita lama e coisas mais.
Em farpas bem colocadas
Naquelas tábuas rachadas,
Arquitectou o seu ninho
Com formato redondinho,
E tinha só um postigo
Esse bem cuidado abrigo.
Um ninho muito engraçado,
Nem lhe faltava o telhado.
Ajudou-a o seu parceiro.
Um casal verdadeiro.

Começou a pôr ovinhos
E nasceram os filhinhos.

II
Dois meninos vão da escola,
Com os livros e uma bola,
Naquele sítio a passar:
Ouviram piar, piar...
Parecia chamamento
A pedir mais alimento.
Descobrindo os passaritos
Começaram logo aos gritos:
--- Olha um ninho! Olha este ninho!
Qual será o passarinho?



--- Andorinha; é o mais certo...
Mas vamos ver lá de perto.
É só destravar as velas,
Logo o ninho desce nelas.
Destravadas, num momento,
Ficam à mercê do vento
Que logo as põe a rodar,
Trazendo o ninho a baixar.
Lá no ninho, os passarinhos,
Ficam tão assustadinhos
Que piavam sempre mais
A chamarem pelos pais.
Estes cuidavam da vida,
Indo buscar-lhes comida.
Um espreitou à janela.
De repente caiu dela,
E, no chão, entre o relvado,
Chorava muito assustado:
--- Piu, piu, piu...Eu vou morrer...---
Os meninos, a correr,
Logo o tomaram nas mãos,
Para o levar aos irmãos.
Com afagos e carinho
Lá o puseram no ninho.
Era um sentir verdadeiro;
Assim, do seu merendeiro,
Tiram migalhas docinhas
Para dar às andorinhas.
Com tanto zelo por elas
Travaram melhor as velas.

Esposende, 1999

O Rouxinol

Trovador de canções belas,
Quem me dera assim cantar
O segredo das estrelas,
O mistério do luar.

Há na alma portuguesa
Cantigas em turbilhão,
Quando canta também reza;
Está sempre em oração.

Canta as serras e os vinhais,
Os pomares cheios de cor;
Canta o mar e os trigais
E as campinas sempre em flor.

Canta o firmamento azul
E encantos do nevoeiro
Como farrapos de tule
Perdidos pelo outeiro.

Meu rouxinol cantador,
Escondido entre os silvado,
Os teus trinados de amor
Dão ternura ao povoado.

Canta, canta, ó rouxinol,
Tuas doces melodias
À tardinha ao pôr do sol,
Ao toque de Avé - Marias.

Ó trovador sem rival,
Cantasse eu na tua vez...
Fazer trovas é sinal
De ser mesmo português.

Mas portuguesa sou eu
Porque tento versejar,
A inspiração vem do céu,
Vem das flores e vem do mar.

ponte difícil de atravessar

Dois jovens atravessam uma ponte
Sobre um rio sereno e bem estreito.
Mas,que medo se vê naquele jeito
Dos corpos, e também em cada fronte.

Ai, que aflição lhes vai dentro do peito!
Na tábua frágil entre cada monte,
Lá vão… em busca doutro horizonte,
Numa aventura digna de respeito.

Atravessar a ponte desta vida,
Mais frágil e imensa, é mais custoso…
Sobre ela tanta gente estarrecida,

Como sobre o oceano tenebroso,
Se não for pelo amor persuadida,
Que só o esforço faz... o venturoso.

Eu

I

Não me atrai o abstracto… irrealidade...
Por isso nada há de modernismo
No que pinto, a expressar o realismo,
Num esforço de achar o que é verdade,

Neste mundo a cair para o abismo,
Empurrado por tanta ambiguidade!...
Tanta incerteza traz fatalidade.
Parece-me existir mais altruísmo

Em clarificar bem o duvidoso:
Mostrar que existe ainda um verde prado;
Mostrar um rio exangue… ou caudaloso;

Algum recanto ainda inundado
De Paz, sem o ruído pavoroso
Que nos deixa o espírito arruinado…


II

Até no que parece uma abstracção,
Pelo jogo das cores sobre a tela,
Sem esforço, sem lei e sem cautela,
Não passa sem haver figuração

De algo real…Paisagem feia ou bela.
Sou assim… Abro a alma e o coração.
E sinto quanto vale a precisão,
Até no que em pintura se revela.

No colégio, já isto me valeu:
“Concurso, na Gulbenkian, de pintura
Para jovens”: mandei um quadro meu.

Com paisagem real e a figura
De jovem camponesa, e mereceu
Lá ficar! Para mim foi a ventura.


III

Os duzentos escudos que ganhei,
Nesse tempo (há bem setenta anos…),
Puseram-me a pensar: “Não houve enganos?...
Valia tanto o quadro que pintei?”

Cheia dos sentimentos mais ufanos,
Com paixão, a pintura eu abracei.
Mas, só com ela, não me contentei:
Nos livros via amigos mais humanos…

Saudosa do colégio, lá na aldeia,
Vendo-me aí em grande solidão,
A pintar eu sentia a alma cheia;

E, se um livro me dava animação,
A escrever, fosse qual fosse a odisseia,
Libertava-se mais o coração.

IV

Assim, eu tinha sempre o tempo cheio.
E deixava que a mente divagasse…
Que fosse em aventuras e voltasse
Com fantasias, sempre num enleio,

Cada uma trazendo o seu disfarce…
Ia então escrevê-las, com receio
De não achar princípio, fim ou meio…
Mas encontrava sempre o desenlace.

Também me deram prémio tais histórias
E poemas: são quatro penas de ouro
Que guardo, de concursos. São vitórias.

Tinha dentro do lar o meu pelouro,
Nas lidas que parecem mais inglórias!...
Mas ia a mente em busca dum tesouro…
Graças a Deus que as pedras são só pedras,
E que os rios não são senão rios,
E que as flores são apenas flores.
Alberto Caeiro


I
“UMA PEDRA É UMA PEDRA”

Uma pedra é uma pedra, insensível,
Mas Deus quando a criou foi com carinho,
A pensar que, na beira dum caminho
Serviria de banco, acessível

Ao caminhante jovem ou velhinho,
Para ter um descanso aprazível,
Na viagem com fim imperceptível…
Cada rochedo é um monstro, ou monstrinho,

Espalhados na serra em profusão:
São manchas de beleza, entre a verdura,
Que Deus pusera li, na intenção

De dar matiz ao verde que satura
Quando acumulado em grande extensão…
Assim, a vida, é alegre ou de amargura…

II
“E UMA FLOR É UMA FLOR”

Deus criou tantas coisas, bem singelas!...
Como as pedras que o homem utiliza
Para casas e mais fins, que idealiza…
Também criou mimosas amarelas,

Parecendo que é o sol que desliza
Pelas margens de estradas. Vemos nelas
O luzir de milhões, milhões de velas.
O que é mais simples…mais sensibiliza:

A violeta humilde, recatada,
Sugere o pensamento mais profundo
A quem a entende… pois fala calada…

Faz-nos pensar no ente moribundo,
Vestida, assim, de cor arroxeada…
Alegrias…tristezas…deste mundo…


III
“E OS RIOS SÃO APENAS RIOS”

Um mundo que não tem monotonia
Porque nele há de tudo, variado…
Desde as pedras, ao rio consagrado,
Para ceder, ao Homem, alegria.

Um rio não tem alma, está provado;
Nem as flores a rir na pradaria;
Destes nadas colhemos regalia
Que Deus nos quis deixar como legado.

Foi a Adão que Deus tudo ofereceu;
Adão a mais perfeita criatura!
Mas lá no Paraíso estremeceu,

De espanto, de emoção, e de ventura,
Ao ver que tudo aquilo era seu!
E mais a Eva, toda formosura!


IV
Adão a desfrutar o Paraíso
Com Eva, sua bela companheira.
Olhando tudo ao longe e à sua beira…
Os seus lábios expressam um sorriso:

A sensibilidade verdadeira
De quem tem Alma e sente que é preciso
Expressar sentimentos, sem aviso,
Basta sorrir…E foi a vez primeira

Que um ser da criação sorriu feliz!...
Porque Adão era mesmo um ser Humano,
Mas era ainda, em tudo, um aprendiz

A distinguir virtudes do profano…
Mais nenhum outro ser sente a motriz
Que leva a amar; sofrer; sentir-se ufano!...

Ninguém detém o Tempo

Ninguém controla o Tempo em correria;
Ninguém o faz parar, nem a polícia,
Que devia autuá-lo, com perícia,
Por não usar travões, em cada dia,

Ou por beber demais… ─ Pura delícia! ─
E andar por aí…Numa ousadia,
Sem soprar ao balão… como devia.
Nem sequer o detém forte milícia.

Avança, incontrolado, sobre nós:
Ainda ontem éramos crianças,
E, hoje, somos todos já avós!...

Mas, afinal, viver nestas andanças,
Faz bem, a rir do Tempo, assim veloz;
Deixando-nos ficar sempre esperanças…